Barcelona acolhe hoje a cimeira bilateral em que os governos espanhol e francês vão discutir, entre outros assuntos, o polémico gasoduto H2Med, que pretende ser a principal infraestrutura de transporte de hidrogénio verde entre os dois países. O projeto foi altamente contestado pelo movimento ambiental, bem como por muitos especialistas da sociedade civil (Gas is not a Solution network, Resposta al BarMar Platform) e círculos científicos (Hydrogen Science Coalition), mas tem o apoio da União Comissão, os governos da Espanha, França e Portugal, e com a “cumplicidade” -sublinhado por Ecologistas en Acción- da Esquerda Republicana da Catalunha (o Presidente da Generalitat assinalou há dias -lembra-se -você desta organização- a sua vontade de aproveitar esta cimeira “para esclarecer e promover a H2Med”).
Neste contexto, a rede Gás não é uma Solução (doravante, a rede), constituída por mais de 30 organizações, entre as quais a Ecologistas en Acción, emitiu ontem um comunicado em que rejeita veementemente este projeto. A esta oposição junta-se a Plataforma Resposta al BarMar, anteriormente formada para responder à construção do gasoduto MidCat, agora abandonado.
Entre as razões que sustentam o posicionamento contra esta infraestrutura, as ONG reunidas em torno desta rejeição destacam uma em particular: “H2Med é uma aposta que põe em causa a viabilidade da transição energética, desviando energia essencial para ‘exportação da procura nacional descarbonização’.
Além disso, a rede considera que ao utilizar um vetor energético como o hidrogénio (H2), “muito ineficiente”, este tipo de infraestrutura perpetua “um modelo centralizado que vai contra as pessoas, o ambiente e continua a favorecer grandes empresas energéticas como a Enagás” . “.
Ecologistas revisam prolegômenos
“Na passada quinta-feira, dia 15 de dezembro, o H2Med foi finalmente apresentado no registo de projetos candidatos a financiamento europeu. Esta infraestrutura envolverá a construção inédita de um conjunto de gasodutos que transportarão inicialmente hidrogénio produzido a partir de energias renováveis. Vai ser adjudicado à Enagás e vai custar entre 2.500 e 3.000 milhões de euros aos cofres públicos”
“Começará em Portugal com o troço Celorico-Zamora (CelZa) e continuará com o troço subaquático Barcelona-Marselha (BarMar). H2Med não pode ser entendido sem outras interconexões que envolverão Huelva, Cartagena, Puertollano, Zamora e Xixón, criando uma rede muito mais ampla e paralela à nossa atual rede de gás. Além disso, o projeto apresentado propõe duas instalações subterrâneas de armazenamento de hidrogênio localizadas em cavidades de sal na Cantábria e no País Basco»
De acordo com a rede Gas is not a Solution, o hidrogénio verde pode sim contribuir para a concretização de um sistema de energia 100% renovável, “mas a sua utilização deve ser reservada para casos específicos em que seria impossível a utilização de outro tipo de energia renovável, em particular para substituir o uso de hidrogênio como matéria-prima em determinados processos industriais, bem como naqueles que exigem altas temperaturas e que atualmente não possuem outras opções de descarbonização”.
O que está acontecendo ?
Pois bem, segundo a rede, o que acontece é que a exportação em grande escala de hidrogénio envolverá “grandes riscos” devido à imaturidade da tecnologia tanto em termos de produção como de transporte de hidrogénio.
“O investimento público seria mais bem aplicado em medidas que já deram certo, como eletrificação, engajamento em projetos renováveis com participação cidadã, autoconsumo, comunidades energéticas e melhoria da eficiência energética das residências
Além dos limites e riscos já mencionados, as organizações agrupadas na rede de rejeição H2Med acrescentam as seguintes considerações:
1.– Exportar grandes quantidades de hidrogênio implicaria a implementação de muitos outros projetos renováveis de grande escala que poderiam ter um alto impacto ambiental e territorial. Existe também o risco de, por falta de energia renovável excedente suficiente, cair na produção de hidrogênio com gás fóssil, como é o caso de 99% do H2 obtido hoje.
2.– O risco acima aumenta devido à baixa eficiência energética do H2, como já apontou o instituto de pesquisa independente Hydrogen Science Coalition. No processo de produção de hidrogênio por eletrólise a partir, por exemplo, de fontes renováveis e durante seu transporte por gasoduto, pode-se perder até 80% da energia investida.
3.– Se o H2Med for finalmente incluído na lista de Projetos de Interesse Comum (PIC), aspirantes a financiamento europeu, poderá beneficiar dos controlos ambientais menos exigentes introduzidos pelo REPowerEU. Como o ClientEarth já denunciou, este pacote de medidas para substituir o gás russo dá aos PICs a possibilidade de contornar o princípio de “No Significant Environmental Damage” (ou “Do No Significant Harm” em inglês) e de serem isentos de avaliações globais de impacto ambiental. .
4.– Este último é particularmente relevante se tivermos em conta que vai atravessar o Golfo do Leão, um dos ecossistemas com maior índice de biodiversidade do Mediterrâneo, onde existem áreas marinhas protegidas, um corredor de cetáceos e o santuário de Pelagos.
Por estas razões, Rede de Gás não é Solução denuncia a posição do Executivo do Estado espanhol. Ele também destaca o apoio que recebe da Generalitat, que considera o H2Med e mais particularmente a seção Barcelona-Marselha (BarMar) “positivamente, no sentido de que marca a Catalunha e Barcelona como um centro nevrálgico da nova estrutura energética europeia”. as palavras de Aragonês. Os riscos associados a este megaprojeto exigem um debate social muito mais amplo e transparente envolvendo os cidadãos.
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