Depressão, uma epidemia silenciosa que atravessa Portugal

Marinho

Lisboa, 25 de setembro (EFE).- Portugal conseguiu superar a crise económica, reduzir o desemprego e modernizar-se, mas o chamado “milagre português” não conseguiu enfrentar uma doença que carrega como um fardo: a depressão, uma “epidemia silenciosa”. ” que causa mil mortes a cada ano.

“A depressão em Portugal tem características epidémicas, é uma epidemia silenciosa”, reconhece o ministro da Saúde português, Adalberto Campos Fernandes, em entrevista à Efe.

“Temos muito trabalho pela frente”, admite Campos, que trabalhou como médico antes de ocupar a pasta da Saúde no governo do socialista António Costa.

Talvez por isso o ministro prefira não especular sobre as raízes de um problema que, sublinha, “é diferente de uma região para outra do país”.

Na região do Alentejo, onde tradicionalmente se regista a maior taxa de suicídio do país, a doença está ligada ao isolamento, à pobreza, ao envelhecimento e a aspectos de natureza familiar.

As estatísticas revelam que as zonas rurais são as mais punidas e que os jovens e as pessoas com mais de 65 anos têm maior probabilidade de cometer suicídio.

O consumo de antidepressivos – no ano passado os portugueses compraram 20 milhões de psicotrópicos pelos quais gastaram cerca de 216 milhões de euros – não se traduziu numa alteração significativa dos números.

A ministra da Saúde reconhece que, embora Portugal possa orgulhar-se do trabalho realizado em áreas como o tratamento do VIH ou das hepatites, “em matéria de saúde mental temos muito trabalho pela frente” e “é uma prioridade para o Sistema Nacional de Saúde.

O problema é particularmente complexo porque, sublinha Campos, “não existe um modelo” que defina as razões das elevadas taxas de suicídio no país, com uma média anual de quase mil vítimas.

Um estudo recente realizado por especialistas da Universidade de Coimbra concluiu que entre 1980 e 2015 foram registadas 31 mil mortes “autoinfligidas”, com maior incidência nas zonas rurais.

O assunto atraiu a atenção de intelectuais, escritores e artistas durante décadas, que refletiram sobre a depressão e a morte de inúmeras maneiras.

O fado “Triste Suerte” descreve bem a intensidade deste sentimento: “Ando pela vida em busca de/ uma noite menos escura/ que traga a luz da lua/ uma noite menos fria/ em que não sinta a agonia/’outro dia ele está morto’.

Em “Pessimismo Nacional”, o médico e escritor Manuel Laranjeira mostra uma visão depressiva de Portugal, em linha com a história do próprio autor, que se suicidou em 1912.

Laranjeira era amigo do espanhol Miguel de Unanumo, que em 1908 escreveu o ensaio “Portugal, uma cidade suicida”, no volume “Por terras de Portugal e Espanha”.

Hoje, uma editora guardou os dois ensaios e acaba de publicá-los em edição única sobre a psicologia coletiva do país.

“Portugal é uma cidade triste mesmo quando sorri”, escreveu Unamuno em 1908.

No entanto, o escritor espanhol visitou o país que definiu como “uma menina linda e meiga” que, de costas para a Europa, observa “como o sol se põe nas águas infinitas”.

“O que é que este Portugal tem para me atrair? O que é que esta terra tem, por fora, sorridente e meiga, por dentro, atormentada e trágica? Não sei, mas quanto mais lá vou, mais quero volte”, admitiu. EFE

qua/ah

Francisco Araújo

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