Admito: estou extremamente incomodado com o caso João Félix. No entanto, como há um debate dentro da tribo esportiva, vamos ao que interessa. Há uma pausa. E pelo cheiro de sangue, todos julgam essa história com um roteiro personalizado, interpretando quem é o mocinho e quem é o bandido no filme. Sem cinza. Há quem acredite que o português tem mais talento adormecido do que os outros acordados, que defendam que deixá-lo no banco é pecado e que acreditem que com outro treinador, João seria Bola de Ouro. Há quem acredite que Simeão Ele sequestrou o clube, sequestrou os torcedores e é cruel com o garoto, pois é um carcereiro talentoso. Depois, há os que têm a certeza de que talento sem trabalho é inútil, os que pensam que João recorda mais maus gestos do que atuações decisivas, e os que consideram que não há treinador desajeitado o suficiente para atirar pedras ao próprio telhado. E como conselho, os que estão cansados de esperar sempre pelo João, os que acreditam que ele é mais bonito do que bom e os que dizem que ele deve sair o quanto antes e fechar bem a porta.
Dois córregos largos da escova. Há quem acredite que João nunca terá sucesso com Cholo e o fará por onde passar. Esta é a opinião mais comum e difundida. Depois, há outra teoria menos popular: se João não tiver sucesso com Simeone, nunca terá sucesso no futebol de elite, aquele de alta intensidade e enorme demanda. O tempo vai dizer. A verdade é que João não está à altura do que o treinador lhe pede e Simeone não está a tirar o melhor partido de um talento que se sente frustrado. Péssimo negócio para todos. João não vence, nem Simeone. Só o Atlético perde.
Aliás, o melão que ninguém quer abrir com João está fazendo perguntas incômodas. Por que, sabendo que um projeto de crack estava sendo assinado, foi pago um prêmio Bola de Ouro consagrado? Esta operação teria sido realizada se o jogador em questão tivesse outro agente? A assinatura multimilionária de um solista fez parte de uma equipa de autores onde todos os seus atores devem ter alma de gregário? João foi uma aposta para realizar um projeto esportivo ou um investimento para um negócio futuro mais completo? Contratar João era o que a equipe precisava ou uma oportunidade de negócio para a SAD? Desses pós, essas lamas. Foi jogo a jogo, não empresa a empresa.
Há quem justifique seu “colismo” dizendo claramente que João é um “menino” que não sente nem sofre por ser um caipira imaturo. É falso, mas vende. E há quem justifique gratuitamente qualquer atitude da criança usando palavras de alto calibre como “bullying”, assédio ou humilhação. Não é verdade, mas faz barulho. O fato é que para defender Simeone não é preciso “cortar” João e para atacar Simeone não adianta branquear João. Esta trincheira, cada vez maior, não permite Cholo, nem João. Isso só prejudica o clube.
Um clube que infelizmente confunde a urgência dos negócios com o que é importante para o seu povo. Menos preocupados com o que vão dizer de João e Cholo e mais preocupados em dar o melhor de si, porque lhes é devido um escudo. Preocupe-se menos com o dinheiro e mais com a equipe. Menos preocupado em assinar mediocridades ao preço do ouro e mais preocupado em abrir mão de cláusulas rescisórias que são PVP. Menos preocupado se João vai jogar boliche e mais em contratar zagueiros saudáveis. Menos preocupação em repetir que é “o melhor time da história” e mais em mostrá-lo. Preocupe-se menos se o estoque está vendendo e camisetas mais decentes. Preocupe-se menos se o amor acabou usando tanto e mais em ouvir seu povo. Aquele que enche o campo, que nunca falha, que nunca deixa de encorajar e que merece muito mais do que este clube lhe dá.
Ruben Ouria
“Estudioso de viagens do mal. Totalmente viciado em café. Escritor. Fanático por mídia social. Estudante amigo dos hipsters.”