O La Felisa era um dos restaurantes mais divertidos e honestos de Cáceres. Felisa era da cidade do “belo grão-de-bico”, Valencia del Ventoso. Ele montou uma pousada e restaurante no primeiro andar da rua Sergio Sánchez que mantinha os costumes de uma antiga pousada e ficava em frente a onde antigamente eram feitas as entradas para Cacereño. Foi consumido em mesas compridas. Ao seu lado podia sentar-se um hippie, um yuppie ou um casal de Baracaldo cujo filho tinha jurado a bandeira.
Em La Felisa comiam rancho, mas que rancho. Eram pratos caseiros de uma cozinha honesta com um sabor divino. Ir comer ao Felisa era uma festa, uma experiência, um dia diferente. Durante o Womad, ele preparou croquetes grandes e deliciosos que rivalizavam com a fama da festa: não sabíamos se queríamos que houvesse Womad para os croquetes ou se queríamos que houvesse croquetes porque isso significava que havia Womad. O negócio, enfim, era comer uns croquetes da Felisa.
Com o tempo, Felisa mudou o restaurante para o térreo, batizou-o de El Paladar de Felisa e o transformou em uma sala de jantar bem equipada, cujo principal charme era o cardápio diário. O restaurante não tinha mais a graça de mesas compridas e companhia improvisada, mas a comida ainda era tão deliciosa quanto a clientela estava certa. E enquanto Felisa baixava o restaurante para o piso inferior, Eva, sua filha, instalava o primeiro vegano da Estremadura no piso deixado vazio.
Após o encerramento do Amapola e do Green Shoots em Cáceres, o único restaurante puramente vegetariano é o Shangri-La em Mérida
Essa história gastronômica não tem final feliz, pois Felisa se aposentou e nos deixou sem o melhor cardápio diário da cidade. Além da aposentadoria da mãe, o restaurante vegano da filha, que se chamava Amapola e oferecia um cardápio macrobiótico diário, também fechou. Cáceres não é um lugar fácil para restaurantes veganos ou vegetarianos. E quando digo Cáceres, quero dizer toda a Extremadura. Na rua Argentina, em Cáceres, abriu um restaurante vegetariano. E enquanto Eva é de Valencia del Ventoso, Álvaro, o promotor dos vegetarianos Brotes verdes, é de Hinojosa del Duque. Os moradores de Badajoz iniciaram em Cáceres negócios complicados sem carne nem peixe que acabaram por fechar e demonstrar quanto nos custa comer só vegetais na Estremadura.
Na semana passada, estive numa pequena cidade fronteiriça portuguesa de 20 habitantes, a 15 quilómetros de qualquer cidade média numa estrada infernal com curvas e contra-curvas e pouco turística. Porém, aos fins de semana abre um restaurante vegetariano tão bonito quanto original e, ainda por cima, com a graça de manter o encanto de partilhar a mesa com outros clientes, à maneira de Felisa. Além disso, o cardápio era único: aquele decidido pelo casal proprietário. E tudo foi tão bom. É claro que os três casais espanhóis que estavam sentados à nossa mesa foram embora quando o homem descobriu que não havia carne ali. Eles não gostaram do plano porque é preciso reconhecer que a comida vegetariana garante sabor, surpresa e originalidade. Mas o restaurante continua sendo um território onde o senhor reina.
Assim numa cidade portuguesa de 30 habitantes há um vegetariano e numa região de um milhão de habitantes há outro, apenas um, Shangri-la, rue Sagasta em Mérida, o único vegetariano puro da região. Foi aberto por uma menina catalã que partiu para Ourense e Ismael da Estremadura acabou com um negócio em funcionamento, embora ainda haja muita gente que fica espantada quando se fala deste tipo de comida. No dia em que nos levantarmos da mesa se não houver legumes, a Estremadura terá dado aquele passo de gigante de que todos falam.
“Estudioso de viagens do mal. Totalmente viciado em café. Escritor. Fanático por mídia social. Estudante amigo dos hipsters.”