Afrodescendentes em Portugal, uma minoria silenciosa sem voz política

Bárbara Pereira

Lisboa, 27 out. (EFE).- Particularmente vulnerável social e economicamente, a grande minoria de afrodescendentes em Portugal enfrenta complexos desafios de integração em um país onde os poderes políticos continuam a ignorá-los.

Sociólogos e associações de imigrantes concordam que a população africana e afrodescendente continua marginalizada da vida política.

Exemplo disso é a baixa representatividade que esta comunidade tem entre os 230 deputados eleitos nas eleições de 4, que acabam de tomar posse.

“Fortes preconceitos raciais ainda sobrevivem na sociedade portuguesa”, disse à Efe o sociólogo Elísio Estanque.

E isso dificulta a integração quatro décadas após o início do processo de independência das ex-colônias portuguesas na África (Angola, Moçambique, Guiné Bissau, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe).

Embora as estatísticas oficiais falem em 90.000 imigrantes africanos legalizados em Portugal, estimativas não oficiais colocam cerca de 500.000 (5% da população portuguesa) que vivem no país com ascendência nas ex-colónias, entre imigrantes de primeira, segunda e até terceira geração.

Para Estanque, professor da Universidade de Coimbra, o preconceito racial é acompanhado por um processo de “despolitização” em Portugal, que anula a possibilidade de desenvolver ações positivas dirigidas às minorias étnicas.

“As ações de afirmação foram mais um simples apoio social do que uma emancipação política”, analisa a pesquisadora, que lamenta o fenômeno da “automarginalização”.

“Se os incluídos fogem da política, os ‘excluídos’ nunca entraram nela”, disse.

Não há melhor exemplo do que a representação no mais alto órgão legislativo de Portugal, onde, segundo dados da própria Assembleia da República, composta por 13 legislaturas e mais de 3.000 deputados, menos de 5% deles eram desses países.

O mesmo não acontece, por exemplo, no futebol profissional, o desporto rei em Portugal. A equipa portuguesa liderada por Cristiano Ronaldo convocou sete jogadores das ex-colónias, perfazendo 30% do último plantel deste mês.

A par de Ronaldo e Luís Figo, o maior símbolo do futebol português é o falecido Eusébio da Silva Ferreira, que trocou Moçambique aos 18 anos.

Globalmente, os cabo-verdianos constituem a maior população. Segundo o Ministério do Interior português, os legalizados ascendem a 41 mil, número que exclui os imigrantes de segunda ou terceira geração, já de nacionalidade portuguesa.

Para o presidente da Associação Cabo-verdiana, Mário de Carvalho, existem várias “limitações” que os impedem de ter voz própria na vida política portuguesa, o que contrasta com o peso que têm no desporto ou na cultura, sobretudo na música, através de artistas como a fadista Mariza ou o grupo Buraka Som Sistema.

Atualmente, a maior parte da população imigrante africana residente em Portugal concentra-se na área metropolitana de Lisboa, em subúrbios como os da região da Amadora.

Eles tendem a trabalhar em empregos de baixa qualificação e baixa remuneração e são mais vulneráveis ​​ao desemprego. “Igualdade de oportunidades não existe. Conheço muitos lutadores treinados que não têm oportunidades. Por isso, defendemos que o grau de competição seja recompensado”, argumentou De Carvalho.

Além disso, segundo Estanque, em Portugal não existe uma política de discriminação positiva no acesso à universidade, como nos Estados Unidos ou no Brasil para afrodescendentes.

Estudos realizados pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa indicam que, historicamente, a emigração destas populações para Portugal divide-se em três períodos.

A primeira, na década de 1960, envolvia trabalhadores, principalmente cabo-verdianos, empregados na construção civil e no trabalho doméstico.

A segunda ocorreu após a descolonização, com a queda da ditadura em Portugal em 1974, quando cerca de 500 mil portugueses retornaram à antiga metrópole, com seus filhos nascidos fora do país, que haviam emigrado para as colônias.

Já na década de 1980 iniciou-se a terceira vaga de emigração por motivos políticos – devido aos conflitos internos estabelecidos nestes países -, que mais tarde se tornou emigração laboral na sequência da integração de Portugal na União Europeia (UE). ).

Cristiano Cunha

"Fã de comida premiada. Organizador freelance. Ninja de bacon. Desbravador de viagens. Entusiasta de música. Fanático por mídia social."

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *